Aplicação prática de Lean em uma gráfica
19 de setembro de 2016Aplicação de Lean Manufacturing em um processo de acabamento de produtos rotomoldados
19 de setembro de 2016Na década de 1.980, tive a oportunidade de trabalhar em projetos “off shore” em campos marítimos de petróleo no nordeste do Brasil, onde as condições operacionais eram muito restritivas. Os contratos de construção e ampliação de plataformas de petróleo geralmente atendiam a mais de uma plataforma. Podemos destacar aqui as principais restrições:
- Canteiros de obra pequenos, geralmente localizados próximos ao porto;
- Plataformas localizadas a 200km do porto;
- Pouco espaço de armazenamento no porto, compartilhado por diversos fornecedores do cliente;
- Embarques de materiais e suprimentos realizados somente às segundas, quartas e sextas-feiras;
- Rebocadores que serviam todas as plataformas e todos os fornecedores do cliente, atendendo produção, exploração, construção e manutenção;
- Pouca disponibilidade de acomodações nas plataformas e limitações na logística de embarque e desembarque da mão de obra;
- Pouco espaço para armazenagem de materiais e insumos nas plataformas (na minha visão, o principal gargalo de todo o processo);
- Comunicação via rádio muito congestionada;
- Burocracia portuária;
- Condições de segurança precárias.
No início, aconteceram algumas experiências desastrosas. Mas, para as difíceis condições de execução daquelas obras, ao final, com a aprendizado da equipe, os prazos foram razoavelmente atendidos. Podemos fazer uma analogia de algumas práticas comuns àqueles projetos com ferramentas, práticas e conceitos preconizadas no “lean construction”. Podemos destacar as principais:
- Células multi-funcionais auto-gerenciadas – benefícios: integração entre os processos. Os canteiros e as plataformas eram pequenos e os processos muito dinâmicos e complexos. Todos trabalhavam muito próximos. Não havia lideranças por disciplina disponíveis o tempo todo, impondo às equipes a discussão em grupo de qualquer tipo de problema, estimulando novas lideranças e trabalho coletivo. As interfaces entre disciplinas também eram facilmente resolvidas;
- Mão de obra multifuncional – benefícios: equipe enxuta e mais qualificada. Havia sempre uma equipe embarcada e outra em terra revezando, sendo que alguns especialistas não tinham par (ficavam embarcados, ou em terra), estimulando as pessoas a executar tarefas de outra disciplina;
- Gemba –benefícios: ganho de tempo e melhoria da qualidade. O chefe de obra, os planejadores e a supervisão passavam a maior parcela do tempo no campo, reduzindo burocracias e interfaces. Os problemas eram facilmente detectados e resolvidos;
- Produção puxada/Just in time – benefício: fornecer/produzir exatamente o que o cliente precisa. O ritmo da produção era definido pela equipe de montagem da plataforma, que informava, via rádio, para a equipe de terra, as pré-fabricações a serem executadas no canteiro e embarcadas, atendendo a uma sequência cuidadosamente planejada. Os lotes de componentes pré-fabricados e acessórios eram definidos e planejados pela equipe embarcada para consumo em dois dias e programados para embarque. A cada dois dias, a área de estocagem na plataforma deveria estar livre para receber um novo lote de materiais. Os materiais (fornecidos pelo cliente) eram requisitados conforme necessidade e retiradas do armazém de suprimentos do cliente, uma ou duas vezes por semana;
- Estoque zero – benefício: redução de custo. O estoque em terra tinha que durar no máximo três dias. Estoques maiores eram inviáveis;
- 5S – benefícios: maior nível de segurança, limpeza e organização. Como não havia espaço para armazenar quase nada nas plataformas, tudo tinha que estar muito organizado. Uma ferramenta que não tivesse mais utilização ou algum material inservível tinha que desembarcar para liberar espaço;
- Produção balanceada – benefício: ambiente equilibrado. A obra tinha um ritmo padronizado, do início ao fim, pois o objetivo era o embarque, com demanda fixa e definida. O efetivo de pessoal e o conjunto de equipamentos foram praticamente constantes ao longo do empreendimento. Não se usava softwares de planejamento: o cronograma e outros recursos de planejamento eram orientativos, com os planejadores e a liderança planejando e acompanhando as etapas no Gemba;
- TPM (Total Productive Maintenance) –benefício: equipamento disponível todo tempo. Os equipamentos embarcados, como geradores, compressores, máquinas de solda e ferramentas elétricas, tinham que estar sempre disponíveis para uso, pois não havia espaço para equipamentos de reposição, obrigando um planejamento cuidadoso de manutenção preventiva;
- Kaizen (melhorias contínuas) – benefícios: maior qualificação do processo e da mão de obra. Os processos eram aprimorados a cada embarque com a contribuição de todos, sem distinção de cargo ou função. Foram muitas as mudanças feitas ao longo daquele projeto para atender às restrições de forma eficiente. Conheci excelentes profissionais e grandes lideranças que se formaram ou aprimoraram suas habilidades naqueles projetos e eles seguiram adotando as mesmas práticas, gerando excelentes resultados, em outros projetos, o que mostra que o conhecimento foi incorporado por eles;
- Objetivos globais e não locais – benefício: ganhos para o projeto como um todo e menos atritos entre as equipes. As equipes precisavam ser muito integradas, criativas e eficientes. Todos, desde o chefe da obra (gerente da contratada), os fiscais da contratante, as pessoas da administração, RH, planejamento, logística, suprimentos e segurança trabalhavam muito próximos, geralmente no campo, e praticavam múltiplas funções. Todos sabiam as metas principais do projeto como um todo e não havia uma discussão entre equipes de disciplinas diferentes.
Compare as situações aqui descritas com a realidade de sua obra e pense no processo como um todo, do projeto conceitual ao teste final. Certamente você encontrará oportunidades para eliminar desperdícios de tempo, espaço, recursos e consequentemente de custos. Muitas vezes, o excesso de recursos, a sobra de espaço, um equipamento ou uma determinada equipe supereficientes, podem causar grande desequilíbrio no processo como um todo. Não há benefício em ser supereficiente na fabricação, se há um gargalo na montagem. A fabricação vai gerar estoques e consequentes custos. As ações conduzidas naquela oportunidade podem facilmente ser implantadas em qualquer tipo de obra, gerando inumeráveis benefícios. Praticando o “lean construction” é possível eliminar muitos desperdícios, baixando os custos e aumentando o retorno financeiro de sua obra.
Texto escrito por Carlos Alberto Paul
Consultor e instrutor
Black Belt Seis Sigma e Lean Practitioner.
35 anos de experiência em planejamento e gerenciamento de projetos no segmento de óleo e gás, incluindo empreendimentos de grande porte na Petrobras.
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